VALE A PENA LER DE NOVO
PENÚLTIMO CAPÍTULO
DA NOVELA BARRENSE
JOGO BAIXO
XII
O golpe
Cabo Villaça estendeu a mão para retirá-la da viatura, Helena levantou-se com as mãos algemadas. Tenente Cláudio tirou do bolso o boletim de ocorrência amarrotado, atirou-o na mesa do delegado João Oliveira e leu: “a acusada de furto atesta para os devidos fins que o dinheiro levado da casa do fina Chico Mafagafos na Boa Vista em Barras juntamente com a ajuda do amante de Berenice, o William Pequi pertencia a La marque Mafagafos”. Helena sentada na cadeira chorava e gemia.
— Helena você fez isso, sim ou não? Perguntou Tenente Cláudio.
Ela voltou o rosto para o outro lado, quis falar... Interrompia-se a cada sílaba.
— Sim.
— E o que tem a dizer da morte de Samantha Murici. Continuou o oficial.
Agora... Dizia ela erguendo-se e estendendo a mão.
— Samantha Murici? Perguntou a mulher.
— Sim, sua amiga lá do bar das Estrelas! Enfatizou o militar.
Helena desmaiou. Ela abaixou a cabeça na mesa, não falou mais.
— Você a matou? Certo!
Cabo Villaça a interpelava: sacudia-a a toda a força. Helena levantou um pouco a cabeça, estava macilenta, tinha os olhos fundos numa sombra negra.
— Deixai-me, maldiçoados! Deixai-me nesse inferno! Gritava Helena.
— Você a matou? Bradou cabo Villaça.
— Você a matou? Perguntou tenente Cláudio.
— Não é verdade... Eu não a matei.
— Por que roubou o dinheiro? Não tem nada haver com a morte de Samantha.
— Como? Perguntou o delegado.
— Com os diabos, delegado! Que isso importa! Mas foi assim...
Dia 13 de janeiro de 1988 a cinco anos atrás, La marque chegou aqui em Barras. Samantha estava no salão de cabelos juntamente comigo e feliz porque iria deixar a vida de prostituição e casar com o homem que amava. Nós discutimos no percurso para rodoviária. Ela disse que o homem dela estava cheio da grana e iriam casar. Eu poderia sair da vida fácil no bar das Estrelas. Fui até o local onde ele estava. Bati na porta e La marque abriu. Encontrei deitado na cama. Ele me conheceu...
— Oi La marque…
—Oi Helena, quanto tempo mulher?
Eu soltei uma gargalhada. Eram sete horas da noite. A noite estava sombria. Nevoeiros frios pairavam nos céus barrenses. Assim que foi tomar banho, eu como um anjo das trevas fiz Samantha cair aos meus pés, lívida e suarenta com a agonia do beijo sexual sobre meus lábios. Ela deitou-se sobre mim. Daí a alguns instantes, eu vi o homem chegar do banho e fingi dormir.
Tudo o mais foi um sonho: a rua completamente deserta e Samantha vinham do salão de cabelos passeando e a noite chuvosa seria o mestre da minha arte. Ela entrou e debruçou-se sobre o leito vazio da cama, eu deitei no leito junto dela, e com um dos braços apunhalei o coração. 13 de janeiro, uma noite que seria o meu passaporte para deixar a vida fácil, um fato fabuloso se não fosse à procura nesses cinco anos pelo dinheiro daquele miserável que está na cela.
La marque veio ao leito de Samantha, mas ela ainda gemia e chorava com uma voz cavernosa e rouca: ele arrancou-lhe o punhal com força, ela gritou mais já estava morta dentro do quarto. Ele atirou-a sobre a cama implorando por socorro: abri a porta do meu quarto. Acendi a lâmpada do pátio defronte ao quarto de Samantha para olhar La marque entrar e eu vir gritando.
Samantha com os lábios pálidos tentaram murmurar no ouvido dele meu nome, mas os interrompi gritando e chamando por dona Marieta. Eu tremi de ver meu semblante tão lívido no quarto dela e lembrei-me que naquele dia ao sair do quarto da morta, no espelho que estava pendurado a parede, eu me horrorizara de ver-me uma assassina... Um tremor, um calafrio se apoderou de mim. Ajoelhei-me, e chorei lágrimas ardentes. Confessei tudo a Berenice: parecia-me que Samantha que se erguia dentre os lençóis do seu leito e me acendia o remorso e no remorso me rasgava o peito.
— Por Deus! Foi uma agonia!
No outro dia conversei friamente com o cabo Villaça. Ele lamentou a falta de Samantha no bar das Estrelas. Mas sobre a noite passada, nem uma palavra. Durante esses cinco anos, todas as noites era a mesma tortura, todos os dias a mesma frieza. Contudo, lembrei-me que o dinheiro não estava com Samantha como disse La marque. Procurei-o na cadeia para dizer-me onde estava com objetivo de pagar um advogado para ele, mas ele recusou-se. Quando eu pedi para o amante de Berenice, o William Pequi ir ao quarto dele no hotel e dar uma busca pelo dinheiro. Porém, Berenice não dormia completamente perto da sinuca no bar das Estrelas, ela viu quando eu lavava minha roupa branca do sangue de Samantha e passou por perto, roçou seus cabelos soltos, e nas lájeas do corredor estalavam umas passadas tímidas de pés nus.
Ela vira tudo e ouvira. Berenice se acordara e sentira por minha falta no leito, a mulher ouvira o grito de Samantha, e correra para ver… agora com cinco anos depois da morte de Samantha, chamei Berenice e a convidei para me acompanhar para Teresina. Nós tínhamos de sair da cidade e eu não queria ir com o amante dela o William Pequi. Saímos juntos: a noite era escura e fria. O vento desfolhava as árvores e os primeiros sopros do inverno rugiam nas folhas secas do chão na rua são José. Caminhamos juntos muito tempo. Berenice parou e desistiu.
— Espera-me aí, disse ela, não vou mais com você, se não serei sua cúmplice.
— Então fique nessa vida desgraçada, pois estou é rica!
Eu sentei no caminho à espera de um ônibus para Teresina: vi àquela hora uma luz de carro clarear-me o rosto e aparecer entre os matos da estrada perto do morro do pipoca, um caminhão. Por fim fiz o motorista parar. O velho abriu a porta do caminhão. Entrei. O que aí se passou na viagem para Teresina, nem eu e nem ele sabemos: quando a porta abriu-se de novo na capital, uma mulher lívida e rica despontava com nova vida. A porta fechou-se.
Alguns minutos depois o motorista seguia viagem sem mim. Eu o amei por duas horas. Quando eu estava decidido a juntar-me com Samantha, o maldito do La marque apareceu do Pará. Senti-me traída após longas noites perdidas ao relento a espreitar-lhe de Samantha um carinho, um amor, quando após tanto desejo e tanta esperança eu sorvi-lhe o primeiro beijo, a primeira noite de amor, Samantha estava decida partir com La marque que voltaria do garimpo rico. Eu acolhi quando chegou no Bar das Estrelas. Fui sua amiga fiel, companheira. Ensinei-lhe a arte da sedução e como arrancar dinheiro dos homens.
Foi uma noite de soluços e lágrimas, de choros e de esperanças, de beijos e promessas, de amor, de voluptuosidade no presente e de sonhos no futuro... Ela desistiu de mim. Vinte anos depois o amante dela, La marque voltava do Pará. A voz sufocou-me na garganta: nós duas chorávamos. Eu também chorava, mas era de saudades de Samantha... Logo que soube da fortuna, o dinheiro de La marque enfeitiçou-me.
Contudo meu amor não morreu! Nem o dela! Muito ardentes foram àquelas horas de amor e de lágrimas, de saudades e beijos, de sonhos e maldições para esquecermos uma da outra. A noite de 13 de janeiro foi uma loucura! Depois dessa noite seguiuse outra... E muitas noites, as folhas sussurraram ao roçar de um passo misterioso, e o vento se embriagou de deleite nas nossas frontes pálidas...
— Muito bem! Agora guarde seu discurso para o juiz da comarca!
Interrompeu uma voz.
— Posso fazer uma pergunta delegado? Interrogou Helena. Quem me denunciara à polícia.
— Berenice! Disse o delegado. É foi à testemunha ocular do crime que você cometeu.
— Eu sabia que foi aquela falsa, sonsa mentirosa, mas eu não matei Samantha!
O homem que falara era um advogado. Um homem já de idade, meio alto de frontes calvas e longas com o rosto fundo em rugas e espessas sobrancelhas grisalhas lampejavam-lhe os olhos azuis e um ralo bigode que cobria parte dos lábios vermelhos da fumaça de cigarros. Trazia um terno negro e uma pasta nas mãos já desbotada, da mesma cor da roupa.
— Quem é o senhor? Perguntou o tenente Cláudio.
— Dr. Júlio César, defensor público.
— Quem é o senhor?
— Eu sou o oficial Tenente Cláudio! Responsável pela prisão da acusada.
Na verdade não foi difícil entender o que estava acontecendo: correu muito boato em Barras, a cada instante nas esquinas saia conversas e mais conversas que mudam até de nome e de sobrenome. La marque via os últimos raios de sol nascer quadrado. Ele apertava as mãos do companheiro Caçoleta antes de ser solto.
— Obrigado amigo!
— Não me agradeça.