sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012


SEXTA-FEIRA: ESPECIAL DO CONTO:
FIM DE TARDE BARRENSE

           Já estava quase que totalmente noite, chovia pouco com um vento entrecortado que vinha do nascente e varria os céus de Barras. O rio Marataoan com pequenas ondas que espumavam e espadanavam de modo barulhento contra as pedras assim que ultrapassavam a barragem de cimento do bairro Boa Vista, erguendo-se em cristas brancas e lançava-se alternadamente saltando apressada uma sobre as outras.
         A impressão que se tinha do Marataoan era de que ele sentia a proximidade do inverno e assustado corria para alguma parte, a fim de fugir daquelas águas que caiam em grossos pingos de chuva.
         Via-se o Marataoan com uma lembrança vã e quente dos áureos tempos em que corria majestoso com águas caudalosas e não havia tanta agressão do povo ao seu leito com o desprezo dos dejetos e lixos domésticos.
         O céu cinzento, pesado e soturno despencava gotículas de chuva que ao longe uma velha canoa de um pescador tornava-se invisível no meio do rio. A pobre canoa remotamente transportava pessoas de um lado para o outro e reinava majestosa sob as águas prateadas.
          Sumia sob a intensa chuva. Viam-se as ondas de o Marataoan assaltar e beijar, lambendo suas bordas que balançava com o vento frio e lastimoso do temporal. O céu com suas lágrimas intermináveis desenhavam o cenário deserto e sombrio deixando a impressão de que tudo estava morrendo.
         O pescador caminhava com seu engancho nas costas para perto da margem e encostava-se na parede de cimento a beira do rio sentindo o vento frio e úmido do início de noite. Ele voltava com uma tarrafa nas mãos. Margeando a beira do rio, o homem tarrafeava macilentamente.
        Seus dentes trinados em honra ao frio e a fome, quando de repente a alegria nos olhos e o medo se dissipavam gradualmente. O pescador sentia algo estrebuchar dentro da tarrafa de malha miúda.
         Sacudindo as mãos querendo aquecê-las do frio e corrigindo a malha da tarrafa que teimava em enrolar-se ao mato, o pescador penteou os cabelos negros molhados e encolheu-se um pouco mais para proteger-se da água que escorria dos céus barrenses.
         Depois de esperar um pouco e olhar para o rio, ele aproximou-se e ficou perto da margem, parado e em pé apreciando o balançar da canoa. Anoitecia, condensavam-se ainda mais a chuva sobre os céus de Barras e de lá os dois observavam as ondas de o rio figurar-se em uma treva gélida e úmida.
         As minúsculas ondas do Marataoan batiam contra as pedras das lavadeiras parecendo esbravejar-se com um som abafado pela chuva que tamborilava com estrépito e freqüência crescente dos pingos fortes e duradouros.
        Naquela ocasião os ânimos estavam mais amáveis. A chuva tornava-se menos forte e o Marataoan imponente rugia com um assobio prolongado, zombeteiro como alguém majestoso e que nada temesse, vaiando os dois ali sozinhos naquela hora.
         Os assobios mórbidos causavam no coração do homem uma dolência e a escuridão uma impressão irônica que o destino sorria com uma expressão misteriosa ao acender da luz nos portes elétricos com velas em campo santo.

        

Nenhum comentário:

Postar um comentário