CHÃO DE FOGO, CAPÍTULO 32
A campainha do colégio Gervásio
Costa soava. E Aurélio não a via. Eunice estudava no terceiro ano do
Científico. Durante o intervalo, ele procurou pela moça que tinha visto na
tarde do dia anterior. De repente surgia na frente dele, a bela Eunice de calça
jeans e blusa branca do colégio caminhando em companhia de outras amigas.
- Oi. Tudo bem?
- Oi...Tudo ótimo e com vc?
Aurelio ficou com receio de se decepcionar,
mas a moça respondeu. O coração do rapaz disparou. A voz de Aurélio tremeu e sem coragem para engatar a conversa, ele resolver deixar por
ali mesmo.
- Eita
será que foi o que eu vi? Disse Débora. Esse gatinho está afim de você, Eunice.
- Que
nada! Ele só foi educado e além do mais é meu vizinho!
- Dizem
na escola que ele escreve poemas. Também ouvi dizer!
- Como é?
Quem? O Aurélio, menina! É metido a poeta, hum!
Aurélio passou os dias sonhar com
Eunice. Escreveu diversos poemas, mas na hora de entregar a moça, ele não tinha
coragem. O rapaz morava com a mãe e os três irmãos numa casa na rua 10 de
novembro. Ele construía os diálogos na mente para num futuro encontro, dizer
tudo a moça:
...Oi! Posso conversar com você... Não, melhor dizer, posso marcar um encontro com você na praça da
matriz, isso deve ser bem mais fácil...
O fim do mês de outubro anunciava
no céu nublado de Barras, uma chuva rápida, típica chuva de verão. Tocava a
campainha do horário da saída e Aurélio apressava o passo, a fim de poder
conversar com Eunice. O sereno aumentou. Ele correu para onde estava a moça.
A moça e mais algumas amigas passavam
a chuva passageira, debaixo do alpendre de uma casa antiga da rua Gervásio
Pires. O som dos pingos das chuvas não deixava o rapaz concentrar-se no
objetivo. O horizonte todo acinzentado, naquela noite com ventos cortantes nas
copas das árvores, a causar um clima de terror. Como num sonho os dois foram
embora para casa.
Os dois jovens faziam companhia um
para o outro. O sonho em busca daquele tempo perdido. Eunice ostentava o
título de a mais bela da rua 10 de novembro. O avô senhor Cassimiro não deixava
a moça solta na rua. Ela vivia de casa para o colégio ou de casa para a igreja.
O tempo restante era de anacrônico isolamento social.
- Quase não vejo você na rua! Meu avô não
deixa! Ah, sim. Soube que você é poeta. Sim! Sempre escrevo poesias. Podia você
escrever uma para mim! É obrigatório, eu escrever? Sim. Também concordo.
Na porta de casa, Cassimiro via
chegando pela calçada Aurélio e Eunice. Eles vinham do Gervásio Costa. Com o
clima mais frio, senhor Cassimiro conversava com Honório. Durante meses não
chovia em Barras.
- Tudo seco! Até o marataoã está
seco.
- Oh, oh, tá espantado? Compadre
Honório.
- Sim! Sim! Oh, mês de outubro
quente do diacho! Já vi mês seco, mas com quentura como está, é demais. Ainda
bem que esfriou mais, compadre.
- Tu conversaste com o rapaz sob o
estado de saúde da mãe dele?
- Quem? Ah, Eunice vem chegando aí
do colégio com ele. É um ótimo rapaz. Inclusive compadre, escreve poemas.
- O quê? É, ele é metido a poeta?
- Sim! Mas ainda é ingênuo, um rapaz, bobo com o
negócio do serviço militar. Esse negócio de Exército não é para todo mundo, não.
- Sabe da nova? Não! Qual? Vou te dizer compadre, o Romeu
lá do mercado é o novo prefeito, sabe? Aquele que fechou as portas do comércio
por causa da confusão com a coletoria?
- Exatamente, ele mesmo. Ele deve
ficar logo esperto, o povo das Barras anda falando que já tem vereador querendo
se vender para ele. Romeu da Bodega vai ser um bom prefeito. Não tem precisão
de roubar, não. É eu não digo que ele não seja bom prefeito viu.
- A culpa de ter perdido o pleito, foi
o prefeito Firmino Carneiro se atrelar com o pessoal do Retiro dos Ciganos.
- É ele se queimou aqui com o povo! Sim, é verdade, compadre.
O novo está surgindo não é? Barras não vota mais em candidato por ser dos ricos
ou um dos pobres.
O tempo está mudando. Mas não se
assuste, compadre Honório, ele pode contar com nosso apoio. Meu voto aqui em
Barras é livre, ninguém me controla. Eu voto, mas
morrendo de medo do prefeito me persegui na prefeitura e me mandar lá para o
Mundo Novo perto de Esperantina.
- Você tem medo de ser mandado para
lá? Sim, sim. Ninguém vai saber em quem você votou, homem. É que eu não tenho
estudo compadre, sou vigia e serviço prestado.
- Ah! Sei como é. Ainda mais com a
prefeitura cheia de puxa sacos do prefeito Firmino Carneiro. Dizem até que ele vai visitar casa por casa dos
funcionários. Ele é
muito corajoso, pois o pessoal do bairro Santinho está esperando ele por lá.
Alguns na prefeitura disseram que o
prefeito vai apoiar os times do copão Rural. Eu fico é preocupado, pois se ele
não paga nem o que prometeu a Liga da cidade, imagine. A Liga de Esportes, talvez nem faça o
campeonato barrense da primeira divisão agora em 1996.
Compadre Cassimiro, eu fico com
medo de perder o emprego. Ninguém sabe o que ele vai fazer, os prestadores de
serviço estão nas mãos dele. Para melhorar tem que mudar, o povo das Barras
aprendeu, o remédio para prefeito ruim é a porca comer.
Espero que o senhor esteja certo,
junto com todo mundo. Mas
diga-me uma coisa, soube do tenente Jerônimo. Não! Ele piorou. Um dos seus
últimos momentos lúcidos foi perguntar por seus companheiros de luta contra os
ciganos na batalha lá do Mocambo.
O tenente Jerônimo está é mal no
hospital Leônidas Melo. Depois de ele morrer, aqui em Barras poucos se lembram
da passagem dos ciganos por este chão, não é?
Está ainda vivo, um dos últimos remanescente daquela época em que
defender a pátria era um orgulho.
- Eita, tu estás esquecendo que eu
também estive por lá, hein. É verdade, compadre. Como foi aquela batalha lá no
Mocambo? Gosto nem de lembrar, compadre. Foi é triste, viu. A estória dar é um
romance e com o nome de Chão de fogo. Boa noite. Boa noite, compadre.
AGUARDE CAPÍTULO 33
Nenhum comentário:
Postar um comentário