quarta-feira, 25 de abril de 2012


ROMANCE TERRA DE MARATAOAN – UM BREVE ESTUDO CRÍTICO


O romance Terra de Marataoan, publicado em e-book em 2011, um ano depois de Galápagos – poesias de degredo 2010,inaugura a estréia de Joaquim Neto Ferreira na prosa ficcional juntamente com a Trilogia de Sonhos Poéticos 2001 – poesias de camalhaço, livro de estréia na poesia e os e-books-digitais “Na Essência da Alma Poética” 2009 e “Galápagos -poesias de degredo” 2011 voltada para uma temática mais rimada.

Há a intensa evocação e recriação do clima interiorano barrense no romance Terra de Marataoan. Uma Barras ainda provinciana e ligada a questão da política, da terra. O Romance Terra de Marataoan é uma espécie de recriação de um clima interiorano e de crítica social.

O livro de estréia na ficção barrense de Joaquim Neto Ferreira termina com o diálogo entre o prefeito Mundico Goma e o vereador Rui Rosas sobre o esquema de apadrinhamento político na qual o vereador sugere ao prefeito para fim de aprovação das contas da prefeitura de Barras no TCE.

O Romance Terra de marataoan começa com a luta do vaqueiro Raimundinho do Joao Tomaz cuidando do pouco gado do quitandeiro Florindo que sofre com as conseqüências da seca de 1982. A crítica também observou que o romance não apresenta problemas de incoerência textual e a sintaxe ocorre por ter períodos curtos entrelaçados aos discursos diretos e indiretos e segue o ritmo psicológico das personagens .

Nota-se que no romance Terra de marataoan a figura do menino Tampinha, na verdade Marcos inicia a sua transição cultural da zona rural, ou seja, a criança precoce do interior barrense faz a sua áspera mudança de contexto social em relação às durezas da vida urbana.

Romance Terra de marataoan mergulha mais fundo na ficção pura e por si um romance topônimo quando remete a uma Barras dos anos oitenta com o declínio das grandes fazendas de gado e latifúndio rural. É mais romance do que um romance social   e por duas razões.

Primeiro o narrador (onisciente-observador) não é mais um simples espectador, ás vezes interfere de forma proposital, quase que falando com o leitor. Segundo, Barras é a terra de marataoan, o centro de tudo, nela age e condiciona a ação. O narrador observador interfere nos acontecimentos e não fica apenas na evocação.

Ele não se restringe a meramente a recordar, mas a promover o decurso e discurso da ação dos personagens. Antes, reflete e arquiteta. O romance Terra de marataoan ousa mais do que um romance caricato no aspecto criação. É um romance topônimo e muito nos lembra Terra do Gado de Afonso Ligório Pires de Carvalho.

A semelhança também do romance barrense com o Quinze de Raquel de Queiroz pela temática. Sem dúvida, não há uma filiação entre ambos, mas há pontos de contato. O próprio Quinze de Raquel de Queiroz no começo pela luta do gado na terra seca recorda o romance cearense

Vejamos:” O vaqueiro Raimundinho do João Tomaz encostado ao mourão da porteira de paus corridos do curral aboiava dolorosamente vendo o gado sair de par em par. As poucas reses deixavam as marcas dos cascos na areia fina do caminho tortuoso descendo o morro à procura por pastos lá para a entrada do Barreiro do Otávio. Os rastros ornamentavam juntamente com os capins a lapidação do desenho serpenteado feito pelos pneus das bicicletas”.

há semelhanças de cenas e de personagens, coincidências que aproximam Romance Terra de marataoan de O Quinze. Por exemplo, o heroísmo e o malogro da seca nas primeiras argüições do capítulo 01.  O romance barrense tem sido fiel a temática da seca, da política, do latifúndio e além do simples topônimo com personagem central.

Joaquim Neto Ferreira vem renovar na sua perspectiva do romance regionalista uma temática já antiga no pleno começo do século XXI, com o advento de novas tecnologias. Mas, como a crítica já o salientou, enquanto em O Romance Terra de marataoan há amargura, há sarcasmo, há a tendência ao caricatural como nos mostra a passagem: "Quando Maria Luzia voltou da quitanda do senhor Florindo, a língua já vinha afiada e eriçada de fuxicos. A velha de tão ruim que nascera entanguida, tremia as mãos insistentemente, com as pernas duras e os olhos cinzentos vidrados, além de colocar a dentadura para dançar de um lado a outro dentro da boca:
- Estão dizendo na quitanda que a confusão de terra no Barreiro é das grandes!

O contrário se ver, nos capítulos seguintes, o texto se impregna de inegável humanidade, de ternura, de maior flexibilidade diante do humano, maior capacidade de compreensão. A nostalgia constante do meio urbano lhe dá uma visão mais ampla, mais nuançada, mais sensível à complexidade da condição humana na luta pela sobrevivência na cidade.

O aspecto da corrupção política ou da miséria social como que se atenua diante das reservas de ternura espontânea. Claro. Há uma tristeza difusa em Romance Terra de marataoan, como há em qualquer outro romance de cunho social ou de crítica social. 

Assim, rigorosamente, o romance barrense é uma iniciação dos romances piauienses como Beira Rio, beira vida de Assis Brasil, Ulisses entre o amor a morte de O. G. Rego de Carvalho com a atmosfera de melancolia, com o pavor da morte.

há uma grandeza humana em Joaquim Neto Ferreira que não falta na obra. E há sempre, enternecedoras, as lembranças do passado, as reminiscências, como os festejos da padroeira, os banhos de rios no marataoan. Romance Terra de Marataoan é, assim, uma densidade ficcional que revela as dimensões poderosas do romancista barrense como criador.

A separação do casamento de Conceição é apenas pano de fundo do romance e fora isso, é apenas um terrível choque afetivo para a humilde família. Agora, a ida para Barras é um segundo golpe. O Mocambo ficou longe, muito longe. 

Mas realmente o mundo rural vai com ele, como uma espécie de companheiro invisível, principalmente quando a cachorrinha piaba depois de dias reaparece:” Tampinha, que estava na porta de casa, saiu precipitadamente e tomou conhecimento do animal que vinha capengando e muito esfomeada. 

O resultado foi correr para ajudar o animal que passara dias na estrada. "Chegava a cachorrinha toda magra e com cortes. Só diferençava dos outros animais pelos olhos penados e a penugem vermelhada. O menino a pegou e a sentiu no colo muito trêmulo e com os olhos pálidos".

O personagem tampinha é das mais perfeitas expressões da criança na literatura moderna. Entrevendo o amor, da irresponsabilidade infantil pela luta com os seus próprios defeitos e as irredutibilidades com o mundo. A separação dos pais e a mudança para a cidade de Barras foi para ele um castigo brutal, uma insuportável prisão.

Joaquim Neto Ferreira começa a surgir no romance a consciência social, a descoberta das diferenças de classe. "Nada realmente que pagasse as insônias e as lágrimas da mulher, mais o dinheiro trazia a esperança e os encantos, páginas tristes desta vida fácil a que o destino põe nas mãos de mulheres".

O livro na forma de e-book começa a ensinar a luta pela sobrevivência na cidade, cita as prostitutas do bar da rua do Brega... e alude ao admirável. A crítica escreve: O elementar, o instintivo, o mundo inteiro da falta de oportunidades e o drama da vida na terra dos governadores, é nada mais que uma ressonância social. 

É um romance de denúncia, pois assim dar significado a corrupção eleitoral que acontece no país inteiro e, pela humanidade das personagens que o povoam, lhe faria ganhar essa universalidade sem a qual os romances piauienses não passam de crônica folclórica.

A sua arte literária é feita de carne e sangue, o romance único gênero de arte que não morre nunca, porque tem em si a sua condição de sobrevivência. Na linguagem do romance barrense, Joaquim Neto Ferreira esboça em cada personagem as figuras que criou, a forte paisagem social de Barras, que logo identificamos pelas tradições, pelas ruas do centro da cidade, na enorme riqueza lírica das cenas e humana que a torna tão nossa, se encontram as características da sua extraordinária obra de ficção.

Romance Terra de marataoan é um romance de formação social, de pensamento crítico.  Seja pela tradição oral, incorporados ao texto, a repetição de argumentos e de experiências, a oscilação entre certa credulidade e a reflexão crítica, tanto por parte do protagonista quanto das outras personagens.

Ele aproxima o representante da cultura barrense que propõe exatamente a mesma discussão num contexto igualmente fechado, isolado, a cultura piauiense.  Barras é a liberdade, é o espaço e a amplidão da conquista dos novos sonhos, das novas conquistas. A luta pela sobrevivência na cidade é a prisão.



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