ROMANCE TERRA DE MARATAOAN – UM BREVE
ESTUDO CRÍTICO
O
romance Terra de Marataoan, publicado em e-book em 2011, um ano depois de Galápagos
– poesias de degredo 2010,inaugura a estréia de Joaquim Neto Ferreira na prosa
ficcional juntamente com a Trilogia de Sonhos Poéticos 2001 –
poesias de camalhaço, livro de estréia na poesia e os e-books-digitais “Na
Essência da Alma Poética” 2009 e “Galápagos -poesias de degredo” 2011 voltada para uma
temática mais rimada.
Há
a intensa evocação e recriação do clima interiorano barrense no romance Terra de
Marataoan. Uma Barras ainda provinciana e ligada a questão da política, da terra. O Romance
Terra de Marataoan é uma espécie de recriação de um clima interiorano e de
crítica social.
O
livro de estréia na ficção barrense de Joaquim Neto Ferreira termina com o
diálogo entre o prefeito Mundico Goma e o vereador Rui Rosas sobre o esquema de
apadrinhamento político na qual o vereador sugere ao prefeito para fim de
aprovação das contas da prefeitura de Barras no TCE.
O
Romance Terra de marataoan começa
com a luta do vaqueiro Raimundinho do Joao Tomaz cuidando do pouco gado do quitandeiro
Florindo que sofre com as conseqüências da seca de 1982. A crítica também
observou que o romance não apresenta problemas de incoerência textual e a
sintaxe ocorre por ter períodos curtos entrelaçados aos discursos diretos e
indiretos e segue o ritmo psicológico das personagens .
Nota-se
que no romance Terra de marataoan a
figura do menino Tampinha, na verdade Marcos inicia a sua transição cultural da
zona rural, ou seja, a criança precoce do interior barrense faz a sua áspera
mudança de contexto social em relação às durezas da vida urbana.
Romance
Terra de marataoan mergulha mais fundo na ficção pura e por si um romance topônimo
quando remete a uma Barras dos anos oitenta com o declínio das grandes fazendas
de gado e latifúndio rural. É mais romance do que um
romance social e por duas razões.
Primeiro
o narrador (onisciente-observador) não é mais um simples espectador, ás vezes
interfere de forma proposital, quase que falando com o leitor. Segundo, Barras é a terra de marataoan, o centro de tudo, nela age e condiciona a ação. O narrador
observador interfere nos acontecimentos e não fica apenas na evocação.
Ele
não se restringe a meramente a recordar, mas a promover o decurso e discurso da ação dos
personagens. Antes, reflete e arquiteta. O romance Terra de marataoan
ousa mais do que um romance caricato no
aspecto criação. É um romance topônimo e muito nos lembra Terra do Gado
de Afonso Ligório Pires de
Carvalho.
A
semelhança também do romance barrense com o Quinze de Raquel de Queiroz pela temática.
Sem dúvida, não há uma
filiação entre ambos, mas há pontos de contato. O
próprio Quinze de Raquel de Queiroz no começo pela
luta do gado na terra seca recorda o romance cearense.
Vejamos:” O vaqueiro Raimundinho do João Tomaz encostado ao mourão
da porteira de paus corridos do curral aboiava dolorosamente vendo o gado sair de par em par. As
poucas reses deixavam as marcas dos cascos na areia fina do caminho tortuoso
descendo o morro à procura por pastos lá para a entrada do Barreiro do Otávio.
Os rastros ornamentavam juntamente com os capins a lapidação do desenho
serpenteado feito pelos pneus das bicicletas”.
há
semelhanças de cenas e de personagens, coincidências que aproximam Romance
Terra de marataoan de O Quinze. Por
exemplo, o heroísmo e o malogro da seca nas primeiras argüições do capítulo 01. O romance barrense tem sido
fiel a temática da seca, da política, do latifúndio e além do simples topônimo com
personagem central.
Joaquim
Neto Ferreira vem renovar na sua perspectiva do romance regionalista uma
temática já antiga no pleno começo do século XXI, com o advento de novas
tecnologias. Mas, como a crítica já o salientou, enquanto em O Romance Terra de
marataoan há amargura, há sarcasmo, há a tendência ao caricatural como nos mostra a passagem: "Quando Maria Luzia voltou da quitanda do senhor Florindo,
a língua já vinha afiada e eriçada de fuxicos. A velha de tão ruim que nascera entanguida, tremia as
mãos insistentemente, com as pernas duras e os olhos cinzentos vidrados, além
de colocar a dentadura para dançar de um lado a outro dentro da boca:
- Estão dizendo na quitanda que a confusão de terra no Barreiro é das
grandes!
O
contrário se ver, nos capítulos seguintes, o texto se impregna de inegável humanidade,
de ternura, de maior flexibilidade diante do humano, maior capacidade de
compreensão. A nostalgia constante do meio urbano lhe dá uma visão mais ampla,
mais nuançada, mais sensível à complexidade da condição humana na luta pela sobrevivência
na cidade.
O
aspecto da corrupção política ou da miséria social como que se atenua diante
das reservas de ternura espontânea. Claro. Há uma tristeza difusa em Romance
Terra de marataoan, como há em qualquer outro romance de
cunho social ou de crítica social.
Assim, rigorosamente, o
romance barrense é uma iniciação dos romances piauienses como Beira Rio,
beira vida de Assis Brasil, Ulisses entre o amor a morte de O. G. Rego de
Carvalho com a atmosfera de melancolia, com o pavor da morte.
há
uma grandeza humana em Joaquim Neto Ferreira que não falta na obra. E há sempre,
enternecedoras, as lembranças do passado, as reminiscências, como os festejos da
padroeira, os banhos de rios no marataoan. Romance Terra de Marataoan
é, assim, uma densidade ficcional que revela as dimensões
poderosas do romancista barrense como criador.
A
separação do casamento de Conceição é apenas pano de fundo do romance e fora isso, é apenas um terrível choque afetivo para a
humilde família. Agora, a ida para Barras é um segundo golpe. O Mocambo ficou
longe, muito longe.
Mas realmente o mundo rural vai com ele, como uma espécie
de companheiro invisível, principalmente quando a cachorrinha piaba depois de
dias reaparece:” Tampinha, que estava na porta de casa, saiu precipitadamente
e tomou conhecimento do animal que vinha capengando e muito esfomeada.
O
resultado foi correr para ajudar o animal que passara dias na estrada. "Chegava a
cachorrinha toda magra e com cortes. Só diferençava dos outros animais pelos
olhos penados e a penugem vermelhada. O menino a pegou e a sentiu no colo muito
trêmulo e com os olhos pálidos".
O personagem tampinha é
das mais perfeitas expressões da criança na literatura moderna. Entrevendo o
amor, da irresponsabilidade infantil pela luta com os seus próprios defeitos e
as irredutibilidades com o mundo. A separação dos pais e a mudança para a
cidade de Barras foi para ele um castigo brutal, uma insuportável prisão.
Joaquim
Neto Ferreira começa a surgir no romance a consciência social, a descoberta das
diferenças de classe. "Nada realmente que
pagasse as insônias e as lágrimas da mulher, mais o dinheiro trazia a esperança
e os encantos, páginas tristes desta vida fácil a que o destino põe nas mãos de
mulheres".
O
livro na forma de e-book começa a ensinar a luta pela sobrevivência na cidade, cita as prostitutas do bar
da rua do Brega... e alude ao admirável. A crítica escreve: O elementar, o
instintivo, o mundo inteiro da falta de oportunidades e o drama da vida na terra dos
governadores, é nada mais que uma ressonância social.
É um romance de denúncia, pois
assim dar significado a corrupção eleitoral que acontece no país inteiro e,
pela humanidade das personagens que o povoam, lhe faria ganhar essa
universalidade sem a qual os romances piauienses não passam de crônica
folclórica.
A
sua arte literária é feita de carne e sangue, o romance único gênero de arte que
não morre nunca, porque tem em si a sua condição de sobrevivência. Na linguagem
do romance barrense, Joaquim Neto Ferreira esboça em cada personagem as figuras
que criou, a forte paisagem social de Barras, que logo identificamos pelas tradições,
pelas ruas do centro da cidade, na enorme riqueza lírica das cenas e humana que
a torna tão nossa, se encontram as características da sua extraordinária obra
de ficção.
Romance
Terra de marataoan é um romance de formação social, de pensamento crítico. Seja pela tradição
oral, incorporados ao texto, a repetição de argumentos e de experiências,
a oscilação entre certa credulidade e a reflexão
crítica, tanto por parte do protagonista quanto das outras
personagens.
Ele
aproxima o representante da cultura barrense que propõe exatamente a mesma discussão
num contexto igualmente fechado, isolado, a cultura piauiense. Barras é a liberdade, é o espaço e a amplidão
da conquista dos novos sonhos, das novas conquistas. A luta pela sobrevivência na
cidade é a prisão.
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