CHÃO
DE FOGO, CAPÍTULO 09
De manhãzinha, saíram os dois pela redondeza
procura a moça. O
pobre vaqueiro Garcia tremendo de medo, só fazia dizer
para o coronel que só podia ser coisa dos
espíritos:
- Agora me segura,
me segura senão
eu caio! Dizia Garcia.
- Não tremas, homem de Deus, que medo é esse?! Respondia o coronel.
E quando voltou para a Fazenda, o coronel viu que Rute de cabeça
baixa e passando por ele no jipe com mestre Zé de Lauro de lado. Parecia que o
mundo vinha abaixo.
- O que é aquilo?
Indagava o coronel Hilário. Aí foi que ele viu que era mesmo, o que
os olhos descreviam. Mestre Zé de Lauro com as mãos cheias de cruzeiros, uma
calça jeans, uma camisa longa, sapatos finos que brilhavam como espelho de tão
engraxados. Ele queria comprar o dote da moça e casar com ela.
O homem bem vestido. O coronel Hilário foi logo se chegando, com a
cara muito zangada. Não daria nunca uma filha para casar com um benzedor, um
cigano. Rute de cabeça baixa, olhos triste, dona Princesinha corria com o
tempo, de satisfeita que a filha retornara para a Fazenda.
- Coronel Hilário, eu vim pedir a mão da sua filha em casamento!
- Olha que desplante é esse, mestre Zé de Lauro. Não casa e não
casa!
Com muita insistência, mas o coronel não aceitou o homem na
família. Mestre Zé de Lauro voltou triste para a casa da cigana Teodora. Coronel
Hilário querendo alegrar a filha resolveu fazer uma grande festa, como antes
nunca visto no Mocambo.
Dona Princesinha para dentro e para fora da Fazenda, mandando
Garcia e os outros empregados preparar a comida para a festa, pois iriam comemorar
o retorno da filha. Lá da quinta, Garcia já iria matar três carneiros gordos e
dois bois. O afeminado Zeca Piedade colocava no fogo dois perus.
Quando foi á noite na Fazenda Córrego D’água, os caboclos da
redondeza dançavam no terreiro. Dona Princesinha saltava do lado para outro, requebrando
o esqueleto ao som da sanfona de Geraldo. Garcia via Creusa mexer mais que
cobra na areia quente, e ele olhando para tudo que era macho, com medo da
mulher se encantar por outro.
O coronel Hilário todo robusto em pé recebia os convidados das
outras Fazendas da região. Gente lá do santo Antonio para o lado de nossa
senhora dos Remédios e do Mundo Novo perto de Esperantina.
- Estou muito infeliz meu pai?
- Eu também estou muito infeliz, Rute. Afinal, você tentou fugir de
casa.
Depois da festa da volta da filha, o coronel mandou dona
Princesinha preparar o quarto para a filha. Era de manhazinha. O sol ia se
levantando no nascente. Mestre Zé de Lauro abriu os olhos e parecia sentir sua desgraça.
E quando abriu, viu de longe o coronel com uns jagunços na frente.
Da janela do quarto aberto, ele avistou os homens que cercavam a
casinha de palha da cigana Teodora por toda parte. O homem chegou, desceu do
cavalo e expulsou o jovem mestre Zé de Lauro das suas propriedades.
- Meu Deus! O que é isso, coronel? Dizia a cigana Teodora.
- Esse seu moleque atrevido. Propôs-me casar com minha filha.
Perdeu toda minha confiança. Quero fora das minhas terras, já.
E três jagunços depois de um assobio tocaram fogo na casinha de
palha dos ciganos. Cosme e Damião ficaram olhando o fogo queimar com tudo
dentro. Coronel Hilário foi tão severo que parecia ser um vento forte a varrer
as pessoas inimigas para longe. Garcia dizia na redondeza que mestre Zé de
Lauro tinha a oração de se esconder. Com as mãos na cabeça, a cigana Teodora
lamentava-se de perder tudo. As labaredas lambiam os talhos da parede de taipa
que caiam uma a uma. O que sobrou o pessoal partira para outra Fazenda pedir
morada ou ficar ao relento.
O acontecido causou muita comoção no povo do Mocambo. Desde o dia
que aconteceu o desmando do coronel Hilário que um ódio fumegava dentro do
coração do povo cigano. Depois de quatro meses de muita solidão, Rute adoecia a
cada dia com ânsia de vômitos, tonturas e mal estar. O coronel Hilário levou a
moça para Barras. O vaqueiro Garcia já tinha se separado de Creusa, depois que pegou
a mulher com o sanfoneiro Geraldo Frazão nas saliências dentro do cocal.
Lá em Barras, os médicos descobriram que o mal de Rute era os
sintomas da gravidez. Depois de tempos a filha do coronel Hilário teve um filho.
Escondia quem era o pai, porém todos no Mocambo sabiam de quem era o menino. O
menino chamava-se Heitor.
O coronel andava muito triste vendo que o neto crescia a cada dia
mais. O menino não poderia ter nascido. O coronel Hilário procurou um meio de
matar a criança. Sabia que o menino era fruto de uma maldição. Pensou no curandeiro
Moisés do Paruá lá da Boca da Mata. Ele poderia ter uma poção que acabasse com
a vida do menino.
Quando Heitor nasceu, o menino era muito doentio e o povo do
Mocambo fazia promessa, Rute rezava, e nada de Heitor melhorar. Um dia, no toque
das ave-marias, o céu escurecendo e Garcia deitando, o último pau da porteira,
dona Princesinha perdeu a paciência e disse uma coisa que não devia dizer:
- Permita Deus que esse menino morra logo.
Passados uns dias, Heitor até melhorara muito. O coronel Hilário
mandou batizar na igreja de santa Luzia e fez uma grande com festa. A festa foi
no mês de dezembro na terra de marataoã. Quando o mês de dezembro entrou, a
Fazenda num dia alegre, o povo a dançar e cantar na frente do coronel.
Moisés do Paruá aproveitou o evento e sem ninguém reparar por sua
falta, entrou no quarto onde o menino estava e deu-lhe de beber uma poção que
tinha dentro do vidro. Ninguém pagou a renda dos carnaubais naquele mês. Coronel
Hilário andava de dentes arreganhados de contente, satisfeito, tratando seus
moradores com educação. E foi assim até que meia noite, depois de uma tempestade, com
trovões e raios cortando as nuvens pelos céus do Mocambo, o menino Heitor com
uma febre alta veio a falecer.
AGUARDE CAPÍTULO 10
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