segunda-feira, 11 de junho de 2012


CHÃO DE FOGO, CAPÍTULO 10


Heitor um menino, muito bonito, de olhos azuis, de cabelos loiros que parecia muito com Rute, além dos traços do jovem mestre Zé de Lauro. O coronel Hilário por dentro de si ficara em paz, mas disfarçava como todo mundo na Fazenda. O pessoal do Mocambo ficou muito desgostoso com o triste acontecido. Rute quando olhava o pequenino no caixão, caía em prantos. E ninguém queria chegar para perto do caixão, com medo da doença misteriosa do menino.

Coronel Hilário não chegou nem a mandar chamar os rezadores. E foram os meses correndo. E foram correndo os meses. Por horas inteiras ficava Rute brincando como se estivesse com o filho no berço. Quando via um caboclo andando pela estrada, pensava ser Zé de Lauro. Ficava de longe olhando as terras do pai até a vista não ver o fim.

Chorava tanto, que a dona Princesinha dizia que era melhor Hilário interná-la em Teresina no Meduna. Mas lá um dia, Rute entrou na mata dos cocais, foi mais longe do que das outras vezes. No meio dos cocais ouviu um choro, um choro mais alto, até que ela olhou e começou a falar no meio do mato:

- Quem está aí? Eu não te abandono, eu te acudo sempre que for preciso. O meu nome é Rute. Grita por mim e pode ficar descansado, que eu venho te valer.

Nada se sucedeu. Tudo silêncio. Cantar de grilos. Rute ficou parada perto da encruzilhada chorando. Tantas lágrimas corriam dos seus olhos, como um riacho de vertentes. Depois calou-se. E ela estava só naquele local. Rute viu umas velas com uns litros de cortezanos debaixo de um pé de angico. Coisas de despacho, macumba.

Não mexeu naquilo. Ficara com receio daquele despacho. Quando chegou a Casa grande da Fazenda, foi um rebuliço só. O coronel Hilário quis saber onde a filha foi.  O povo do Mocambo a falar pelas estradas que uma criança andava chorando pelas matas de cocais. As quebradeiras de coco iam de muitas para as matas com medo da alma penada. Rute sentia cada vez mais triste por pensarem ser seu filho que morrera. Tudo parecia mesmo que era por causa dele.

Todas as manhãs, quando o sol nascia, ela ia para a beira da estrada para ver se mestre Zé de Lauro aparecia. E Garcia chegava de longe, de muito longe e não trazia notícias do homem.  Insistia novamente e ia até o curral e perguntava ao vaqueiro se ele sabia de alguma coisa.

Garcia não podia fazer ou dizer nada, ele não tinha visto, nem ouvido sobre o tal mestre há meses. Havia muito rumores pelo Mocambo que os ciganos do bando de Zé de Lauro andavam atacando as fazendas de gado pelo lado do retiro de Boa Esperança. Nunca mais tinha passado por aquelas terras ou por dentro do cocal. E foi indo assim, até que um dia Rute amanheceu entristecida, nervosa, começou a quebrar tudo dentro da casa grande.

O coronel Hilário mandou Garcia amarrá-la com cordas. Ela tinha começado a ter crises. Adoecia dias após dia. Não houve médico que soubesse o que era. Vieram doutores de Barras, feiticeiros do Lameirão, Barro Preto e até um do Maranhão. E quando Rute sentiu que piorara, entre uma convulsão, alucinação e chamou pelo jovem Zé de Lauro na frente do pai. O homem falou:

- Aquele desgraçado foi quem te embuchou!

Rute chorou muito, mas depois de tanto pranto, começou a pensar no filho. O coronel já estava mesmo convencido que a moça estava doente. Lembrou do que ouviu de Moisés do Paruá que a moça precisava era de homem. Um casamento a curaria dos ataques.

Talvez, a cigana Teodora fizera feitiço com o diabo ou mestre Zé de Lauro caprichando nos serviços para enlouquecer a filha e atazanar toda família. Quem sabe, pensou ele, que aquela maldição não seria um sinal do diabo da cigana Teodora para que ele pagasse pela expulsão das terras e a queima da casa.

E assim pensando, mandou chamar a dona Princesinha. E deu um beijo na testa da mulher como se tivesse despedindo-se dela. Quando dona Princesinha soube das intenções de seu marido, correu para o santuário e começou a chorar alto, a chorar tanto, derramando lágrimas, como um olho de água de pé de serra para Deus livrá-los da maldição. Talvez, o coronel queria se suicidar.

- Deus, meu Deus, gritava ela, vem me acudir nessa hora.

E quando ela ouviu, foi um barulho que vinha do nascente. Um reboar do trovão nas alturas. Uma onda de vento invadiu a sala grande da Fazenda. Ela sentiu uma coisa bater no seu corpo, arrastar os pés pelo chão, seus olhos arregalaram, apareceu na sua frente rapidamente a visagem de um menino loirinho:

- Valha-me Deus! A velha gritou.

Dona Princesinha contou toda a história da visagem a Hilário. Era a mais engraçada estória ouvida, dizia ele.

- Não acredito nisso não, mulher.

Eu te salvarei de tudo. Pede a Deus que tu te salves de tudo isso.  Dona Princesinha voltou para o quarto, ela desconsolada disse para a filha que o pai não acreditou na estória. Rute ficou espantada com o que foi dito pela mãe, mas não se desenganou.  

Quando apareceu o pai, a filha o olhou como ela nunca tivesse visto. Mas logo que pensou na desfeita do casamento dela com Zé de Lauro começou a chorar outra vez. E com aquela agonia no coração correu para dentro do quarto gritando pela mãe. Garcia sentava no banco de angico da casa grande e com lágrimas nos olhos se reclamava com o coronel.

- O gado está morrendo, coronel Hilário! O gado está morrendo! Quem poderá salvar!

O coronel Hilário só dava um gemido indiferente aquilo. Tossia muito deitado na rede.

- Garcia vai a Barras e diz a tenente Jerônimo que eu o chamo aqui.

E o homem mandou o vaqueiro a Barras procurar pelo militar. De dentro do quarto, ouvia-se os gritos de Rute que não queria casar com o delegado de Barras. Ela não queria se casar com tenente Jerônimo.

- Não tem nada não, disse dona Princesinha, não tem nada, é um homem valente.

Mas, Rute tinha que se casar com ele. O pai impusera. E mandou outra vez o mensageiro para Barras, procurar pelo homem da polícia. Lá um dia chegou o delegado de Barras, tenente Jerônimo todo vestido com uma roupa apresentável. Ele já chegou procurando pela filha do coronel.

Rute dormiu depois dos gritos. Sonhou com o amado Zé de Lauro muito bonito. Beijavam-se apaixonadamente. Gritos e gemidos dos dois pela cama. O coronel via que era o único meio para ajudar a filha era mesmo casá-la com o tenente. Ele dizia lá de fora deitado na cama.

- Não tem nada não, minha esposa. Rute precisa mesmo é de marido. Deixar chorar. O tenente é homem de posição na sociedade.

Moisés do Paruá disse ser mesmo o único jeito. Volta e pede a ele que reze aqui na Fazenda.  E dona Princesinha fez tantos agrados a Moisés do Paruá que ficou contente da vida. Foi logo falar com Rute.  O homem queria um maço de velas de todas as cores. Velas pequenas, grandes, litros de cortezano do armazém da Fazenda.  O coronel atendeu ao pedido.  E disse para Garcia arranjar tudo que Moisés do Paruá pedia:

- Danem-se. Tragam-lhe as velas, cachaça, galinha preta, o que for.

E saiu Garcia pela madrugada batendo de porta em porta atrás das velas. Rute vendo o homem no sonho por quem era apaixonado e ficava toda contente. Quando amanheceu contou o sonho para mãe. Rute até cantava de feliz. Ouviu-se um barulho que vinha da sala. Dona Princesinha contava tudo do sonho de Rute ao marido.

Moisés do Paruá ouvindo dona Princesinha dizer ao coronel sobre o sonho de Rute. O homem explicou aos dois que Rute fora vítima de ataque dos súcubos. Os demônios que penetrava os sonhos das moças a fim de buscar por relações sexuais. Mestre Zé de Lauro era muito bom com o poder de usar a oração dos súcubos para atacá-la durante os sonhos e fazer a mulher apaixonar-se por ele loucamente.


Coronel Hilário saltou de raiva. Os dois ficavam no terreiro da Fazenda conversando.  Estavam eles com pensamentos na cabeça, quando ouviu uma voz que vinha de longe:

- Esse negócio de súcubos existe mesmo, Moisés do Paruá? Perguntava o afeminado Zeca Piedade.

- Sim! E são muito maledicentes esses demônios. Dizia Moisés do Paruá.
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De repente, o homem começou a contar a estória dos anjos e demônios. O coronel sentia-se assombrando com a estória dos súcubos. O espanto de dona Princesinha ainda foi maior do que o do homem. A mulher não parava de escutar. Corria um zunzum pela sala grande da Fazenda que tenente Jerônimo chegaria no outro dia.  E demorou um pouco, Moisés do Paruá começou a estrebuchar no chão feito cachorro doido.

O homem foi dando suspiros pelo ar, tremendo até que o negócio se fora embora. Moisés do Paruá correu para a mata de cocal, a fim de iniciar logo os trabalhos que coronel Hilário pediu. 

AGUARDE CAPÍTULO 11

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