terça-feira, 12 de junho de 2012


CHÃO DE FOGO, CAPÍTULO 11


-  Eita, Judite que essa estória de coronel Hilário e o cigano Zé de Lauro me deu foi sono. Falou Salviano.

- Então, já para cama. Disse ela. Depois perguntem ao senhor Cassimiro sobre o final da estória. ok

Judite partira para o hospital a fim de passar a noite com a prima Sinhá. Ás dez horas dentro do quarto no hospital Leônidas Melo, dona Sinhá não sentia mais os braços. Um formigamento tomava conta do corpo da mulher. As pálpebras adormeciam. Dois suspiros, o coração parava.

- Desfibrilador! Desfibrilador! Gritavam. O hospital não tem, então fazer massagens, massagens. É a infecção generalizou-se.

Dona Sinhá já estava há muitos dias sem poder se levantar. Escaras tomavam as costas da mulher. Tinha uma escara das grandes que já tomava todo o cóccix e exalava um fétido cheiro por toda a enfermaria. Os dias inteiros, ela ficava na cama, com um lenço amarrado na cabeça e o corpo todo debaixo do lençol. E as dores no pé da barriga aumentavam. Já com a enfermidade avançada que dava pena da pobre. Era a pior das agonias para a prima Judite que via o sofrimento da mulher.

Aurélio no Gervásio Costa já não aprendia mais nada. Os outros filhos da mulher cada um de pai diferente, sofriam sem a mãe. Ela casara a segunda vez e também o marido deixara por outra. O pai de Aurélio morava para o lado do bairro são Cristovão. Ele tinha uma quitanda na saída para Teresina. Não ajudava o filho. Os outros irmãos de Aurélio mangava do pai dele que na quitanda estava só as prateleiras. Aurélio também não gostava dele.

Quando foi na noite do levante do mastro, a mãe de Aurélio estava muito doente. Três meses completara do sofrimento da mulher. Já ás dez horas da noite finalmente partira para o outro mundo. A família sem dinheiro para o caixão. O rapaz feito barata tonta, sem saber o que fazer. Caminhava para o rumo da praça monsenhor Bozon chorando, com as mãos na cabeça.

Quando seu Cassimiro soube que a prefeitura dava os caixões, mas naquela hora ninguém encontrara o responsável pela chave da porta, pois o homem havia sido demitido. Ninguém sabia com quem Pedro Adão deixara a chave. Senhor Cassimiro teve que comprar o caixão fiado na funerária.  A impressão que se tinha era que a prefeitura tinha abandonado, esquecido os pobres.

A secretaria de Assistência Social parecia um cabide de emprego antes da eleição. Depois quase não havia ninguém durante o expediente. As injustiças sociais do mundo não mereciam reclamação naquela hora de dor, dizia senhor Cassimiro. Ele não ofendia o prefeito e nem julgava. Até porque se via muito em Barras, pessoas do bairro Santinho peregrinar o dia todo na porta da Prefeitura. O prefeito nem aparecia no gabinete para recebê-los.

A crueldade do prefeito Firmino Carneiro, depois da perca da eleição era indiferente aos reclames do povo. A alma do homem não era capaz, nem de alegrias nem de pesares, com o sofrimento alheio. Do lado de fora do hospital esperando o corpo, senhor Cassimiro conversava com o João da tilápia que parava a bicicleta, com o isopor dos grandes cheio de peixes na garupa.

- E dona Sinhá, melhorou seu Cassimiro? Que nada! Ela faleceu, João.

Ela estava mal no hospital. Quando o relógio bateu dez horas, pelos corredores do hospital era uma correria só. Uma enfermeira passou chorando, vindo da enfermaria. Chegava mesmo a hora de dona Sinhá. Ouvia-se só a voz do doutor Batista.

- Ela não agüentava mais a demora do SUS em liberar a cirurgia.

E o choro de Aurélio cada vez mais alto. Era todo ele agora um rumor abafado juntamente com os três irmãos. Parecia que o mundo do pobre desabava.

-Traz uma vela. Que o corpo vai para a capela. Dizia o vigia do hospital.

-Não! A funerária está trazendo o caixão, vai mesmo direto para casa dela. Respondeu Cassimiro.

- Coitada de Sinhá! Depois de três meses doente, três meses que descobrira a doença partir assim, tão nova. Lamentava-se João da tilápia.

Da enfermaria ouvia nítido, o pobre Aurélio choramingando a partida da mãe. E eram choros e soluços enfraquecidos, inaudíveis. Aurélio dizia que a morte rondava somente os pobres. Devia levar os ricos também. Ele entrou na enfermaria que a mãe estava e tudo foi consumado. Às dez e meia da noite levavam o corpo.

Na sala da casa de dona Sinhá, umas velas acesas sobre umas cadeiras de couro. Na cabeceira do caixão, uma mesa com um pano, e uma imagem de nossa senhora da Conceição. Da porta da rua, os vizinhos olhavam o velório sem acreditar. A casa se enchia de famílias da rua 10 de novembro. Quando abriram a tampa do caixão, de vez em quando Aurélio olhava para a mãe inerte no meio da sala.

- Mãe, a senhora nem vai ser seu filho soldado do Exército, mãe.

O enterro saia às seis horas da manhã para o cemitério são José no bairro Pequizeiro. Aurélio e os três irmãos choravam alto, lastimavam-se da sorte. Quando chegaram do enterro, Aurélio chorava, e os irmãos também. E o começo de noite, o choro firmava-se mais ainda, pois a saudade dos meninos era de partir o coração. Alguns dos meninos foram dormir com pavor na casa dos poucos parentes. Os parentes ficavam de levar cada um para suas casas.

Aurélio ficou na casa do vizinho Cassimiro, a fim de botar sentido na casa da mãe. Ele sentia uma insônia daquelas, por não está acostumado a dormir em lugar desconhecido. O rapaz, o mais velho de dona Sinhá, ficou espiando as frestas da lua, por entre as telhas até pegar no sono. Ele virava o rosto para a parede, para ver a alma da mãe, aparecer. 

AGUARDE CAPÍTULO 12

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